segunda-feira, 24 de outubro de 2022

O Matador - The Killer

 

Durante todos estes anos de existência deste blog, já escrevi sobre alguns dos mais emblemáticos filmes de ação de todos os tempos. Desde o cartunesco “Comando Para Matar” até o tenso e realista “Lágrimas do Sol”.

Mas ainda havia um filme que não sei por que cargas d’água ainda não havia tido coragem de externar minha opinião. Talvez por ser um dos mais singulares exemplares de filmes que já tive o prazer de assistir,

Me refiro a “O Matador-The Killer”, a obra prima de John Woo.

O cinema de Hong Kong sempre foi profícuo em sua produção de filmes de ação, em geral voltados para o nicho das artes marciais. Mas em meados dos anos 1980 alguns cineastas passaram a querer dar um passo a mais, e quem sabe de passo a passo ir mais longe.

Na linha de frente deste movimento se encontravam os nomes de Tsui Hark e John Woo. Um movimento que teria grande influência sobre o cinema norte-americano da década seguinte.

Tsui Hark

E em 1989 os dois se unem, Tsui como produtor e Woo como diretor, para o que em tese poderia ser apenas mais um filme, mas que como outros já resenhados aqui se tornou um capítulo único nas histórias de seus realizadores.

John Woo

Quando se dá uma olhada na web, e nos deparamos com um resumo de “O Matador”, nem de longe se dá para imaginar o caldeirão de influências extremamente bem dosadas que este filme nos brinda e muito menos as outras tantas que foi capaz ade gerar.

No roteiro, Jeffrey Chow, o matador do título, vivido por Chow Yun Fat (estrela da maioria dos filmes de John Woo), ao realizar um “serviço” acaba disparando sua arma junto ao rosto da cantora Jenny (Sally Yeh) que lesiona as córneas.

Tempos depois, Chow acaba salvando Jenny de uma dupla de ladrões, e toma conhecimento do real estado da cantora que ainda sonhava com um transplante de córneas antes que perdesse por completo a visão. Então antes de se “aposentar”, nosso matador aceita um último trabalho, para com o dinheiro ganho financiar a operação de Jenny fora de Hong Kong.

Só que durante sua fuga enquanto era perseguido pelo policial Lee (Danny Lee), nosso matador é emboscado por atiradores contratados para fazer aquela tradicional “queima de arquivo”. E no meio do tiroteio uma menina é ferida.

E a forma como Jeffrey trata a situação da garota ferida, mesmo que colocando sua vida e liberdade em risco chama a atenção do policial.

A partir daí começa a se desenvolver uma outra estória envolvendo os protagonistas que até então se encontravam em lados antagônicos, mas que se veem um espelhado no outro, tanto pela forma como agem como ao perceberem estarem sendo manipulados num jogo sujo.

E em meio a alguns dos tiroteios mais insanos da história do cinema, John Woo vai tecendo sua colcha de emoções, sim emoções, pois “O Matador” é acima de tudo um filme que transborda em emoções das mais diversas, sem a menor vergonha de expô-las, mas sem em nenhum instante esquecer de ser um filme de ação.

Isto te lembra algo? Sim, é claro.

Não estou afirmando, mas é possível ver aqui um bocado da mesma atmosfera que anos depois Luc Besson aplicaria em seu “O Profissional”. Aliás roteiros de assassinos em crise de consciência se tornou uma premissa bastante utilizada durante os anos 1990, nos gerando alguns dos melhores filmes do gênero daquela década como “O Atirador” com Dolph Lundgren, ou “Assassinos Substitutos” protagonizado por ninguém menos que o próprio Chow Yun Fat.

Nos conduzindo através de um caminho de personagens que ainda que tenhamos visto em outras obras, poucas vezes foram tratados com a sutileza e profundidade que se vê aqui, embalados por uma trilha sonora melódica que lembra bastante a trilha sonora de algumas animações nipônicas da mesma época, em especial a já resenhada aqui “Wicked City”.

Hora reverenciando os antigos filmes de gangster, hora flertando com o faroeste (mais faroeste que a harmônica tocada por Chow é impossível). Numa mistura de cenas tocantes que se intercalam com cenas da mais crua violência gráfica, mas que estão lá para justamente complementar nossa experiência e nos fazer torcer por aqueles personagens.

Além lógico daquele festival de “maneirismos” típicos de John Woo e nos anos seguintes exaustivamente copiados pelo cinema estadunidense, como as famosas cenas em que um personagem em um momento crítico aponta a arma para o outro e vice-versa. E as indefectíveis pombas brancas, a marca registrada mais conhecida do diretor.

Como resultado desta pérola - além de outro filme seu, “Fervura Máxima”-, e o bom marketing que gente como Quentin Tarantino fez de seu trabalho, John Woo carimbou seu passaporte para Hollywood, levando a reboque seu amigo e maior astro, Chow Yun Fat, mas que estranhamente seguiu seus próprios rumos dentro do cinema norte-americano.

E eis que chegamos então em 2022. E não é que mais de trinta anos depois, é anunciado que “O Matador” ganhará um remake norte-americano. Até aí nada demais, mas o detalhe aqui é que o próprio John Woo está à frente do projeto.

A ideia é boa? Você que talvez nem tenha assistido ao filme original possa estar se perguntando agora.

Bem, na humilde opinião deste escriba, o fato de Woo estar envolvido com a coisa toda é muito bom, mas não dá para se ter certeza do êxito desta empreitada por dois motivos básicos.

O primeiro é que considero “O Matador” um daqueles filmes que estão no mesmo pacote de “Robocop” ou “De Volta Para O Futuro”, ou seja, são “inrrefilmáveis”.

E segundo, porque no fim das contas, o “Matador” acaba por ser sobretudo, uma jornada - ainda que meio frenética as vezes -, sobre amizade e honra.


E como diz o próprio Jeffrey Chow em determinado ponto do filme: O mundo agora está mudado. A palavra “honra” é palavrão.

Mas isto só o tempo dirá. O mesmo tempo que cunhou “O Matador” como um dos melhores filmes de todos os tempos.



 

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