Durante
todos estes anos de existência deste blog, já escrevi sobre alguns dos mais
emblemáticos filmes de ação de todos os tempos. Desde o cartunesco “Comando Para Matar” até o tenso e realista “Lágrimas do Sol”.
Mas
ainda havia um filme que não sei por que cargas d’água ainda não havia tido
coragem de externar minha opinião. Talvez por ser um dos mais singulares
exemplares de filmes que já tive o prazer de assistir,
Me
refiro a “O Matador-The Killer”, a obra prima de John Woo.
O
cinema de Hong Kong sempre foi profícuo em sua produção de filmes de ação, em
geral voltados para o nicho das artes marciais. Mas em meados dos anos 1980
alguns cineastas passaram a querer dar um passo a mais, e quem sabe de passo a
passo ir mais longe.
Na linha de frente deste movimento se encontravam os nomes de Tsui Hark e John Woo. Um movimento que teria grande influência sobre o cinema norte-americano da década seguinte.
Tsui Hark |
E
em 1989 os dois se unem, Tsui como produtor e Woo como diretor, para o que em
tese poderia ser apenas mais um filme, mas que como outros já resenhados aqui
se tornou um capítulo único nas histórias de seus realizadores.
John Woo |
Quando
se dá uma olhada na web, e nos deparamos com um resumo de “O Matador”, nem de
longe se dá para imaginar o caldeirão de influências extremamente bem dosadas
que este filme nos brinda e muito menos as outras tantas que foi capaz ade
gerar.
No
roteiro, Jeffrey Chow, o matador do título, vivido por Chow Yun Fat (estrela da
maioria dos filmes de John Woo), ao realizar um “serviço” acaba disparando sua
arma junto ao rosto da cantora Jenny (Sally Yeh) que lesiona as córneas.
Tempos
depois, Chow acaba salvando Jenny de uma dupla de ladrões, e toma conhecimento
do real estado da cantora que ainda sonhava com um transplante de córneas antes
que perdesse por completo a visão. Então antes de se “aposentar”, nosso matador aceita
um último trabalho, para com o dinheiro ganho financiar a operação de Jenny
fora de Hong Kong.
Só
que durante sua fuga enquanto era perseguido pelo policial Lee (Danny Lee),
nosso matador é emboscado por atiradores contratados para fazer aquela
tradicional “queima de arquivo”. E no meio do tiroteio uma menina é ferida.
E a
forma como Jeffrey trata a situação da garota ferida, mesmo que colocando sua
vida e liberdade em risco chama a atenção do policial.
A
partir daí começa a se desenvolver uma outra estória envolvendo os
protagonistas que até então se encontravam em lados antagônicos, mas que se
veem um espelhado no outro, tanto pela forma como agem como ao perceberem
estarem sendo manipulados num jogo sujo.
E
em meio a alguns dos tiroteios mais insanos da história do cinema, John Woo vai
tecendo sua colcha de emoções, sim emoções, pois “O Matador” é acima de tudo um
filme que transborda em emoções das mais diversas, sem a menor vergonha de
expô-las, mas sem em nenhum instante esquecer de ser um filme de ação.
Isto
te lembra algo? Sim, é claro.
Não
estou afirmando, mas é possível ver aqui um bocado da mesma atmosfera que anos
depois Luc Besson aplicaria em seu “O Profissional”. Aliás roteiros de
assassinos em crise de consciência se tornou uma premissa bastante utilizada
durante os anos 1990, nos gerando alguns dos melhores filmes do gênero daquela
década como “O Atirador” com Dolph Lundgren, ou “Assassinos Substitutos”
protagonizado por ninguém menos que o próprio Chow Yun Fat.
Nos
conduzindo através de um caminho de personagens que ainda que tenhamos visto em
outras obras, poucas vezes foram tratados com a sutileza e profundidade que se
vê aqui, embalados por uma trilha sonora melódica que lembra bastante a trilha
sonora de algumas animações nipônicas da mesma época, em especial a já
resenhada aqui “Wicked City”.
Hora
reverenciando os antigos filmes de gangster, hora flertando com o faroeste
(mais faroeste que a harmônica tocada por Chow é impossível). Numa mistura de cenas
tocantes que se intercalam com cenas da mais crua violência gráfica, mas que
estão lá para justamente complementar nossa experiência e nos fazer torcer por
aqueles personagens.
Além
lógico daquele festival de “maneirismos” típicos de John Woo e nos anos
seguintes exaustivamente copiados pelo cinema estadunidense, como as famosas
cenas em que um personagem em um momento crítico aponta a arma para o outro e
vice-versa. E as indefectíveis pombas brancas, a marca registrada mais conhecida
do diretor.
Como
resultado desta pérola - além de outro filme seu, “Fervura Máxima”-, e o bom
marketing que gente como Quentin Tarantino fez de seu trabalho, John Woo
carimbou seu passaporte para Hollywood, levando a reboque seu amigo e maior
astro, Chow Yun Fat, mas que estranhamente seguiu seus próprios rumos dentro do
cinema norte-americano.
E eis
que chegamos então em 2022. E não é que mais de trinta anos depois, é anunciado
que “O Matador” ganhará um remake norte-americano. Até aí nada demais, mas o
detalhe aqui é que o próprio John Woo está à frente do projeto.
A ideia
é boa? Você que talvez nem tenha assistido ao filme original possa estar se
perguntando agora.
Bem,
na humilde opinião deste escriba, o fato de Woo estar envolvido com a coisa
toda é muito bom, mas não dá para se ter certeza do êxito desta empreitada por
dois motivos básicos.
O primeiro
é que considero “O Matador” um daqueles filmes que estão no mesmo pacote de “Robocop”
ou “De Volta Para O Futuro”, ou seja, são “inrrefilmáveis”.
E segundo,
porque no fim das contas, o “Matador” acaba por ser sobretudo, uma jornada -
ainda que meio frenética as vezes -, sobre amizade e honra.
E como
diz o próprio Jeffrey Chow em determinado ponto do filme: O mundo agora está
mudado. A palavra “honra” é palavrão.
Mas
isto só o tempo dirá. O mesmo tempo que cunhou “O Matador” como um dos melhores
filmes de todos os tempos.