Até
meados da década de 1960, mesmo que com animações bem sucedidas como Astro Boy,
Fantomas e Gigantor, os japoneses pareciam ainda engatinhar quando comparados
aos que os norte-americanos faziam.
Mas
em 1967 com a velocidade de um carro de corridas, as aventuras de um jovem
piloto se espalhariam ao redor do mundo, estabelecendo alguns novos parâmetros e
encantando plateias.
Era
Mach Go Go Go, ou como ficou conhecido mundialmente, Speed Racer!
Criado
por Tatsuo Yoshida para a revista Shonen Book em 1966, logo a popularidade do jovem
piloto de corridas Go Mifune (o nome original de Speed) caiu no gosto do
público , e em menos de um ano, veio a se transformar em animação.
Tatsuo Yoshida |
Com
o sobrenome dado em homenagem ao ator Toshiro Mifune do clássico “Os Sete
Samurais”, e que coincidentemente naquele mesmo ano interpretou um piloto de
corridas no filme “Gran Prix", em pouco tempo as aventuras do audaz piloto
de apenas dezoito anos repetiam nas telinhas o sucesso dos quadrinhos.
Contudo,
o êxito em seu país não seria nada se comparado ao que estava por vir, e em
1968, através da distribuidora TransLux, a animação aportava em território
norte-americano.
Rebatizado
para o nome que tão bem conhecemos, fora, lógico, a ocidentalização dos nomes
de seus personagens, ainda que com uma produção bem básica, que muito se
inspirou nas táticas dos estúdios Hanna-Barbera para baratear e agilizar a
produção das células de animação, tinha principalmente no carisma de seus
personagens a sua melhor característica.
E
aqui começa aquilo que diferenciou Speed Racer de todas as animações feitas
anteriormente no Japão, lançando as bases de algumas características que se
tornariam regras quase indeléveis no que viria a ser feito a partir dali.
Até
ali as animações japonesas se calçavam muito no estereótipo de super-heróis, e
suas histórias não fugiam ao “quadrado básico” deste tipo de abordagem padrão.
Mas
em Speed Racer a despeito de todas as incríveis corridas e seus carros
fantásticos, havia o fator humano. Não apenas presente nas bem construídas
personalidades de seus protagonistas, como tendo um fio condutor que sustentava
a expectativa do público pelo que ia acontecer.
Speed
era um jovem impulsivo, idealista e guiado por um forte senso de justiça. Sendo
que no início da animação seus desejos batiam de frente com os do seu pai, Pops
Racer /Daisuke Mifune que não queria que o filho se tornasse piloto.
Pops, o pai de Speed |
Tudo
porque no passado, seu filho mais velho, Rex/ Kenichi Mifune, tinha participado
de uma corrida sem o consentimento do pai. Rex acaba sofrendo um grave
acidente, do qual até escapa, mas que deixa o carro completamente destruído.
Pai
e filho então brigam feio, e Rex abandona o lar, assumindo anos depois a
identidade do Corredor X, que de quebra era um agente secreto.
OK.
Mas por que me dei ao trabalho de descrever tudo isto que tanto conhecemos?
Bem,
é interessante perceber como são estes tipos de “gancho” que costumam a
sustentar a longevidade de várias obras, mesmo que quando crianças tudo o que
costuma a interessar sejam a ação e os feitos heroicos.
E
esta base, mesmo que talvez não feita propositalmente com esta intenção,
tornou-se uma referência de estrutura de roteiro para quase tudo que veio
depois nas animações nipônicas. Claro que tal conceito foi posteriormente
elevado a outros patamares, mas a sementinha da coisa foi plantada aí.
Isto
como algumas outras características interessantes que colocam inclusive, Speed
Racer como uma obra ligeiramente a frente de seu tempo.
Rex se tornou o Corredor X |
Foi em Speed Racer que um tipo de personagem coadjuvante surgiu. Lógico que estou falando de Rex, o Corredor X, como havia citado na lista de 10 Personagens Coadjuvantes Melhores que os Protagonistas. Aqui foram fincadas as bases de um tipo de coadjuvante que é o oposto do protagonista, e que se tornou figura comum não só nas animações, como até em seriados live action nipônicos, que por vezes surge como um anti-herói e indefectivelmente vem coberto por uma aura de mistério, e aqui poderia citar muitos personagens como Ikki (Cavaleiros do Zoodiáco), Hiei (Yu Yu Hakusho) e até Lucifer (Cybercops), entre tantos outros.
Trixie, a namorada |
Fora
isto, não podemos esquecer Trixie/ Michi Shimura, a namorada de Speed, que era
a completa antítese do papel da mulher na sociedade japonesa da época, e um
reflexo do que já se via no resto do mundo. Sem deixar de ser delicada e
sonhadora, era sobretudo valente e esperta, as vezes até mais esperta que o
próprio namorado.
Ao migrar para o ocidente, Aya Mifune perdeu sua identidade (lamentável) |
Num
contraste grande com a matriarca da
família Racer, que pouco ou nada influenciava em algo, mesmo vendo a família
rachada ao meio, apesar que o pior veio na ocidentalização da animação, pois
perdeu seu nome original, Aya Mifune, e foi reduzida apenas a “mãe”! Sim, a mãe
de Speed ficou sem nome no ocidente.
Sparky |
E
não podemos esquecer de Sparky/Sabu, o zeloso mecânico de Speed, amigo de todos
os momentos. Tão zeloso que acaba inclusive sendo agredido pelo intempestivo
piloto em certo episódio, mas uma vez reforçando o viés humano que citei alguns
parágrafos acima.
Gorducho e Zequinha (ou Chim Chim) |
Mas
como nem tudo pode ser tragédia o tempo todo, o “alívio cômico” vinha por conta
de Gorducho/Kunio, o intrometido irmão caçula de Speed, e seu chimpanzé de estimação
Zequinha/Sanpei (que em algumas dublagens também é chamado de Chim Chim) que na
prática era o grande companheiro do garoto.
E
lógico haviam os antagonistas.
Melange,
Kabala, o Carro Mamute e a Equipe Acrobática eram alguns dos adversários que
disputavam com Speed e ocasionalmente também o Corredor X as perigosas e
surreais corridas ao redor do mundo.
Kabala... |
...o Carro Mamute... |
...e a Equipe Acrobática, alguns dos adversários de Speed |
Cheias
de desafios para o Mach 5, o carro projetado por Pops Racer que faria James
Bond ficar roxo de inveja, tamanha a quantidade de gadgets e
dispositivos que possuía.
Cada
um deles controlado por um botão no volante do carro.
Com
o tempo e a forma como Speed Racer se tornou algo mítico dentro da cultura pop,
novas versões das aventuras do jovem piloto se tornaram inevitáveis.
Fora
os quadrinhos, tanto em seu país de origem como as versões estadunidenses,
Speed Racer ganhou algumas outras versões.
Em
1993 foi lançada “The New Adventures of Speed Racer", pensada para ser uma continuação da série dos
anos 60. Mas de mudar o visual icônico do carro de Speed à não entrar no mérito
daquelas características que citei, que fazem longevidade de várias obras,
acabou tendo como resultado apenas uma única temporada com um total de apenas
13 episódios produzidos.
Ai
como a coisa de continuar a série clássica não havia dado certo, em 1997
chegava “Speed Racer X", que se propunha ser um remake, uma versão
modernizada do clássico. Não dá para dizer que tenha sido um fracasso de todo,
se comparado ao seriado de 1993, mas dos 52 episódios originalmente previstos,
acabou com apenas 34 produzidos.
Tá
achando que acabou? Que nada! Pois em 2008 chegava “Speed Racer Next
Generation". Uma história para lá de louca sobre o filho, sim o filho de
Speed, que cresceu num orfanato
administrado por seu próprio tio Gorducho, sem saber de sua real origem. E
pasmem, há também o filho do Corredor X nesta coisa amalucada que até poderia
render algo bom se não tivesse tentado pegar carona no carro errado.
E
óbvio não poderia deixar de citar que neste mesmo ano de 2008, chegava aos
cinemas um sonho que era acalentado pelos fãs do piloto em todo mundo fazia
décadas. Enfim, Speed Racer se tornava
um filme live action.
Apesar de reunir bom elenco (no geral)... |
E
tudo parecia perfeito. Afinal, a
produção australiana, alemã e norte-americana, vinha sob a batuta do produtor
Joel Silver (Máquina Mortífera) que ali repetia a dobradinha com as irmãs Lilly
e Lana Wachomski com as quais tinha realizado “Matrix". E contava com um
belo elenco que tinha gente como Susan Sarandon, John Goodman, Cristina Ricci, e o na época astro
Mattew Fox que ainda surfava no sucesso de “Lost".
...o live ation não agradou. |
Pessoalmente, hoje em dia não considero o filme assim tão
ruim, como considerei na época de seu lançamento. Mas a verdade é que a
película carece e muito de um tratamento mais “orgânico” que tirasse dela a
bizarra cara de “animação de Hot Wheels" para vender brinquedos, fora, lógico, o protagonista, Emile Hisch que não convenceu.
Como
muitos, até hoje aguardo por um retorno de Speed Racer. Sem o fardo da “memória
afetiva”, e que adapte sobretudo com carinho as aventuras que cativaram e
cativam tantos por décadas.
Seja
como for, uma coisa é certa. A marca deixada por Speed Racer é incontestável.
Não só para a evolução da animação nipônica, como no imaginário popular,
mostrando que na corrida contra o tempo a criação de Tatsuo Yoshida até hoje é
referência.
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