Desde
que se iniciaram os eventos relacionados ao chamado “universo cinematográfico
da DC”, que a casa de alguns dos mais icônicos símbolos da cultura pop mundial
vinha sofrendo vários tipos de revés em seus filmes, hora por culpa de
executivos de estúdio, hora por causa de diretores irregulares que se julgavam
capazes de reinventar a roda, desrespeitando de maneira acintosa o cerne de
personagens que cunharam seu nome ao longo de décadas.
Uma
situação para lá de incômoda para quem, apesar de erros aqui e ali, podia bater
no peito e dizer que possuía a célula
mater dos filmes modernos do gênero - o Superman de Richard Donner -, e a
trilogia que transcendeu de forma até hoje não igualada o gênero - a Dark Knight
Trilogy do Batman de Cristopher Nolan.
Mas
dentro dos poucos acertos que eram inegáveis neste “novo universo da DC” nos
cinemas, o elenco feminino figurava em destaque. Desde “Homem de Aço” com Diane
Lane (Martha Kent) e Antje Traue (Faora) até o trágico Esquadrão Suicida com
Viola Davis (Amanda Waller, excelente), lá estavam elas sempre protagonizando aquela
cena salvadora que fazia valer ao menos em parte o dinheiro do ingresso, e não
foi nada diferente quando em Batman versus Superman surgiu Gal Gadot e sua
inacreditável Diana de Themyscera.
Surgia
para o mundo a Mulher Maravilha!
E
sim, bastaram poucas cenas e falas, para o mundo (incluso este que lhes
escreve) cair de encantos pela perfeita personificação da guerreira amazona, de
olhar ferino e sorriso contagiante.
Diana faz sua chegada em grande estilo em Batman vs Superman |
Mas
ainda faltava algo. Faltava o protagonismo que tanto a personagem merecia, só
lhe dado na longínqua série de tevê dos anos 70, mas nunca concedido numa
grande tela de cinema.
Mas
em 1º de junho de 2017 tudo mudou!
Cartaz promocional do filme. |
A
primeira coisa que nos salta aos olhos em Mulher Maravilhas, como mencionei, é
sua protagonista. A israelense Gal Gadot se
tornou a personificação perfeita de Diana, transcendendo seu próprio “eu”,
colocando-a talvez no mesmo hall de
gente como Christopher Reeve (Superman) e Gary Oldman (Comissário Gordon),
demonstrando um amadurecimento como atriz que muitos críticos ainda fizeram
questão de colocar “reticências” em suas resenhas, mas que mesmo que não a
coloque no nível de uma Meryl Streep, só para citar como exemplo, é sim nítido
e sólido. Sem falar no sorriso mais contagiante da sétima arte em décadas.
E a
segunda, mas que poderia ser a primeira (risos), é sua diretora.
Tendo
em seu currículo o ótimo “Monster” e uma briga feroz com a Marvel Studios que
cerceou sua liberdade em “Thor - O Mundo Sombrio”, oque a fez largar o projeto,
Patricia Lea Jenkins, ou simplesmente Patty Jenkins, chegou a DC/Warner em meio
a um baita bombardeio de críticas, e com serenidade e um baita pulso, tomou o
projeto em seus braços tal qual uma mãe protege um filho, defendendo-o a todo
custo de boatos e péssimas influências.
Patty Jenkins... |
...a grande "comandante" do filme. |
Fã declarada
do Superman de Richard Donner, algo que cheguei a citar no artigo que fiz sobre
o filme do “azulão” de 1978. Patty conduziu com maestria a história de Diana, a
princesa de Themyscera, filha de Hypolita, seguindo a risca os ensinamentos do
mestre.
Patty com Richard Donner que deu sua benção a diretora |
Mas
não ainda a super-heroína que a maioria se acostumou a ver.
Pois
aqui além de um conto de origem, oque temos é a dura saga de transição de uma
princesa, que por mais que tivesse tido ensinamentos e treinamento nos mais
diversos campos de conhecimento, a bem da verdade vivia numa cúpula protegida
pela sua mãe a rainha Hypolita (Connie Nielsen, excelente) que sabendo da razão
de sua existência tenta a todo custo impedir sua “evolução”, mesmo a contra
gosto da própria irmã, a general Antíope (Robin Wright).
Durante o trinamento com Antíope... |
...Diana começa a descobrir quem de fato era. |
Só
que quando Diana se depara com o “mundo real”, a princesa passa a aprender, às
vezes sorrindo, às vezes chorando, tudo oque aquele mundo tinha para lhe
oferecer e lhe ensinar, numa metáfora bem rara para filmes do gênero, que neste
ponto nos faz lembrar do jovem Bruce Wayne de Batman Begins, enquanto procura
se manter fiel aos seus princípios tal qual qualquer um de nós.
E
isto cria a cena mais empolgante não só do filme, mas do gênero em muitos anos,
quando em meio a desolação da chamada “Terra de Ninguém” decide agir quando
ninguém o fazia, sendo com seu exemplo aquilo que todo o herói precisa ser, um
motivador.
E
por falar em se manter fiel, não é que houve gente reclamando que o filme não
se passava na 2ª Guerra Mundial como originalmente é a origem da Mulher
Maravilha. Mas aqui reside mais um e talvez o maior dos acertos do filme.
Nestes
tempos politicamente corretos do levantar de bandeiras representativas, lógico
que o estúdio iria jogar pesado em cima da questão a emancipação feminina. E
não são raras as obras que ao tentar seguir o caminho do “politicamente
correto” dão com os burros n’água ao se tornarem panfletárias e
consequentemente chatas.
Mas
aqui não é o caso, pois ao transportar a ação para a década de 10 do século
passado, o filme conseguiu de forma fluída mostrar tal questão já que o tema da
contestação do machismo cabia como uma luva para a época. O que não quer dizer
que os homens em Mulher Maravilha tenham sido demonizados, não, muito pelo
contrário, oque configura mais um ponto para a obra de Patty...ou talvez dois.
Como
dois? Bem vamos por partes.
O fator humano passou a ser parte importante da narrativa em Mulher Maravilha |
Se
há uma coisa inegável no universo da DC Comics que muitas vezes passa batido
pelo público médio é a importância que os núcleos de pessoas comuns têm. No
caso do Superman, por exemplo, temos não apenas seus pais, como o núcleo do
Planeta Diário com Lois, Perry White e logico o melhor amigo de Clark, Jimi
Olsen. E nem vou citar aqui o caso do Batman e todos que compõe o mundo de
Gotham, pois acho que já falei demais sobre isto na série de artigos sobre a
trilogia de Nolan.
E
aqui no filme da Mulher Maravilha esta característica que vinha sendo
negligenciada é mostrada de maneira explícita, principalmente no grupo que
acompanha Diana e Steve Trevor através das linhas inimigas, com destaque total
para o personagem Chefe (Eugene Brave Rock, ótimo).
Chefe (Eugene Brave Rock) - Lições passadas para Diana |
E
aqui entramos naquilo que comentei, de não só os homens não serem demonizados,
como a própria Diana acabar por aprender lições para si com eles. Como quando
ao conversar com Chefe no acampamento à noite e escutar a história de como o
povo do índio tinha sido dizimado ela o indaga que tinha feito aquilo, e
olhando para Steve Trevor que dormia, Chefe responde que tinha sido o povo de
Steve.
Steve
Trevor que foi mais uma grata surpresa, pois Chris Pine que sempre foi um
canastrão (não que isto seja necessariamente algo ruim), tem aqui a melhor
interpretação da carreira até hoje. Tendo uma sinergia com Gal Gadot da melhor
qualidade.
Diana (Gal Gadot) e Steve Trevor (Chris Pine) - Sintonia perfeita |
Sinergia
esta que também possuía sua contrapartida nos vilões, general Ludendorff (Danny
Houston, muito bom) personagem da vida real adaptado para o filme e a Doutora
Veneno (Elena Anya).
Ludendorff (Danny Houston) e a Dra.Veneno (Elena Anaya) |
E
por falar em vilão, lógico, temos de pensar em Ares, o Deus da Guerra (David
Thwelis), que durante quase todo o filme fica escondido “atrás das cortinas”
por assim dizer com a única intenção de corromper Diana. Uma decisão acertada
de roteiro, ainda que esta manipulação não tenha sido realizada com a mesma
maestria de um Coringa de Ledger.
Ares ataca... |
...e tenta corromper Diana |
Ares, o Deus da Guerra |
A
isto some todo tipo de boa referência, incluso aí a referência/reverência explícita
de Patty a Donner na cena do beco. Ou na cena que Diana vai provar um vestido
numa loja londrina que foi retirada direto do seriado dos anos 70.
A homenagem direta ao Superman de Richard Donner |
Um
trabalho excepcional de figurino, tanto nos figurinos imaginários, quanto e
principalmente nos figurinos de época, que fazem a gente pensar sobre a
capacidade cognitiva da banca de seleção do Oscar.
A junção de figurinos imaginados com outros representativos da época - Um dos pontos altos da produção |
A
música tema espetacular de Junkie XL que empolga e impacta no primeiro acorde e
que aqui tem a oportunidade de brilhar, sendo usada com extrema sabedoria ao
longo do filme.
E
aquilo que considero o principal. Aquela sensação que você não entrou no cinema
apenas como um mero passatempo de duas horas.
Fazendo
de Mulher Maravilha não apenas um mero filme de super-herói, mas, sobretudo uma
brisa de ar fresco, não apenas para as recentes produções com o selo DC nos
cinemas, como também um ponto fora da curva no “mais do mesmo” geral, ao mesmo
tempo em que segue a risca aquilo que foi traçado por Richard Donner e Mario
Puzo quarenta anos atrás.
Um
filme que não apenas é para se assistir, mas para se acreditar.
Meu amigo, que texto LINDO. Enfim alguém pôs em palavras o que já habitava nas mentes e corações desta legião de fãs (antigos e novos) que como você, nos rendemos a maestria desta, desde já imortal, obra de arte. Obrigado e parabéns!
ResponderExcluirObrigado!
ExcluirClassifico como seu melhor texto...e olhe que todos eles são excelentes!
ResponderExcluirObrigada e parabéns José Carlos Sandor!!
Obrigado!
ExcluirMuito bom... Sou suspeita em falar da Mulher Maravilha, que se tornou minha inspiração ... DCnauta forever ...
ResponderExcluirAmei. Posta mais endeusando essa Deus 😍
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