Você
que acompanha o Ponte de Comando sabe o quanto tenho admiração pela arte do
cinema de animação. Arte que durante muitos anos viu suas produções feitas para
tevê, em especial após o fim do chamado “DC Timmverse”, decaírem numa
descendente lamentável, com produções de cunho cada vez mais infantil (aqui no
sentido pejorativo mesmo), apostando em soluções esporrentas de última hora
para satisfazer plateias já “viciadas” em cacoetes narrativos.
Mas
eis que num certo dia de 2012 fui tomado de assalto por algo que jamais poderia
imaginar. Um remake, uma releitura de um seriado que jamais havia figurado
entre meus preferidos justamente por conter alguns dos elementos que critiquei
no parágrafo acima, e que simplesmente é uma das obras mais bem produzidas e
escritas que já tive o prazer de assistir na tevê.
Os
Novos Thundercats!
Produzido
pela Warner Bros Animation, com suas células de animação a cargo do estúdio
japonês Studio 4ºC, esta nova versão sobre a história dos “gatos do trovão”
estreou na tevê norte-americana em 29 de julho de 2011.
Mas
o que Os Novos Thundercats tem de tão especial?
Numa
resposta simples eu diria: TUDO!
Os Thundercats 2011 - Novas perspectivas sobre os "Gatos do Trovão" |
Para
começar temos a sapiência de seus realizadores, que adotaram o esquema
preconizado lá nos anos 1970 por Patrulha Estelar de se contar a saga como uma
novela, ainda que aqui cada episódio em geral consiga se fechar em torno de si.
Isto possibilitou que sua mitologia pudesse ser mostrada aos poucos, e não
jogada em cima do espectador como no original, quando eram bombardeados nos três
primeiros episódios por um mundo (ainda que não muito vasto) de informações
para depois cair num imenso marasmo do velho esquema “vilão faz plano, herói
vence vilão”.
Esquema,
aliás, que aqui passa muito longe.
Com
uma abordagem bem mais madura, a animação mostra a saga de Lion-O, o senhor dos
Thundercats, e de seus aliados de uma forma que poucas animações para tevê
tiveram a coragem de fazer.
Ampliando
a mitologia da saga, num Terceiro Mundo no qual Thundera, o Reino dos Gatos,
era a mais poderosa de várias nações de “animais”, e vivia em guerra contra os
lagartos que escravizavam quando eram feitos prisioneiros.
O Rei Claudius e Jagar antes da queda de Thundera |
Com
todos seus personagens possuindo suas personalidades muito bem desenvolvidas, passam
longe do arquétipo juvenil cartunescos da obra original, sendo mostrados como
seres falhos e cheios de conflitos, como no caso de Lion-O e Tygra que aqui são
filhos do Rei Claudius e que vivem entre si uma disputa pessoal, não só de
egos, mas que passa para outro tipo de viés quando Cheetarah entra em cena.
Tygra e Lyon-O - Irmãos e rivais |
E com o "fator Cheetarah" tudo fica mais complicado |
E
falando em irmãos, Willykit e Willykat são dois moradores de rua que para
sobreviver além fazerem truques circenses, comentem pequenos furtos. Mas
permanecem cumprindo sua função, aqui de fato necessária, de representar um lado
mais leve da trama.
Willykit e Willykat - Origem nas ruas. |
Assim
como Snarf, o mascote de Lion-O, que naquela que talvez seja a decisão mais
acertada deste remake.... NÃO FALA!
Não sendo mais aquele arremedo de “Grilo Falante” que tínhamos nos anos 80, até
porque aqui Lion-O ainda que jovem e idealista, nem de longe precisa deste tipo
de auxílio. Que nos poucos momentos em que ocorrem vem na forma do espírito de
Jagar, o guerreiro ancião, mas que aqui não fica surgindo a toda hora como se
fosse um Obi Wan Kenobi genérico.
E
óbvio, Panthro, que aqui é um general, dado como desaparecido no começo do desenho,
e que veríamos ter sido traído por Grune, um antigo amigo que se une aos
lagartos do general Escamoso ao ser corrompido por Mumm-Ra.
Chacal tem um encontro imediato do pior grau com os punhos de Panthro |
Sim!
Mumm-Ra, o “De vida Eterna”, que não apenas é um ser malévolo na melhor (ou
seria pior?) síntese da expressão, como tem enfim explicado todo o ódio que
sente com relação aos “gatos”, coisa que a animação original insinuou,
insinuou, mas que de fato jamais explicou.
E
já que falamos dos antagonistas é impossível não ressaltar que nesta
recauchutada geral, Simiano e Chacal que no desenho original beiravam
personagens cômicos, são aqui retratados com autênticos psicopatas, e páreas
dentro de seus próprios povos, sendo “recrutados” por Mumm-Ra quando os planos de
Lion-O de mostrar aos lagartos e demais raças do Terceiro Mundo que a
coexistência entre as espécies era sim possível começa a mostrar pequenos, mas
expressivos resultados.
Escamoso ao "resgatar" Simiano - Assim como Chacal o macaco era um verdadeiro psicopata |
Fora
o Abutre, que se mostra o estereótipo perfeito de um político, como o próprio
se define num determinado momento, diante do fato de escolher entre seu próprio
povo ou não bater de frente com Mumm-Ra.
Abutre - Um dos personagens que menos mudou em ralação ao original dos aos 80. |
Mumm-Ra
que também usa de sentimentos como raiva, para manipular personagens que nos
anos 80 eram a síntese do “bom mocismo”, como no arco que envolve Pumyra, no
original uma personagem quase sem expressão, mas que nesta releitura ganha uma
importância impensada e um desenrolar inesperado. Aliás, de forma muito
parecida à manipulação que o Coringa de Heath Ledger faz em Batman O Cavaleiro
das Trevas.
Pumyra - Uma tragédia pessoal e a manipulação de Mumm-Ra criam um ódio imenso dentro dela |
E
aqui entramos num dos pontos mais expressivos de Os Novos Thundercats, pois se
no original dos anos 80 as lições que eram transmitidas vinham de forma
didática, no melhor estilo “babá eletrônica”, aqui elas fluem juntamente com a
história, tornando oque poderia descarrilhar numa espiral burra de pieguice, em
algo absolutamente lúdico e emocionante, podendo ser assimiladas de formas
diversas por quem por ventura esteja assistindo.
Algumas das "espécies" que habitam o Terceiro Mundo |
Formas
diversas, que ganham vida nas representações de seres que de meros penduricalhos
narrativos, ganham toda uma simbologia, como no caso dos Elefantes e dos
Petalares. Importantes até para diluir situações pouco ortodoxas para animações
feitas para tevê, como quando Panthro perde os dois braços, que mais tarde são
substituídos por
próteses biônicas cheias de funções criadas pelos Berbils.
Panthro tem seus braços perdidos na luta contra Grune |
Mas
aí você pode questionar: Não há defeitos nesta animação?
Claro,
nem tudo são acertos. E ao menos no meu entender, o ponto fraco destes Novos
Thundercats reside na não utilização da trilha sonora incidental clássica, e em seu caracter design,
em especial dos protagonistas, mas nada que de fato possa ser algo que influencia
de forma negativa o total da obra. Sem falar que é preciso ressaltar o belo upgrade que o ThunderTank teve, se
tornando uma máquina de fato intimidadora só pela sua simples presença.
O novo Thunder Tank - Muito maior e intimidador. |
Alguns esboços do que viria a ser o novo Thunder Tank |
De
quebra os produtores ainda tiveram a ideia de brindar os fãs antigos com dois
ótimos fans sevices no episódio
“Legado”, quando Mumm-Ra ao recrutar suas tropas, surge no vídeo as imagens do
Monstro Estelar de Silverhawks, e de Mako de TigerSharks (esta uma animação que
não chegou a passar no Brasil).
O Monstro Estelar de SilverHawks e Mako de TigerSharks - Referência pouca é bobagem |
Tudo
sensacional certo?
Nem
tanto. Pois uma obra de animação como esta, lógico, a exemplo de outras
produções aqui descritas, acabou pagando um preço alto, o do cancelamento.
Motivos?
Talvez possa ser apontados vários.
Desde
a aversão impensada do público antigo médio que muitas (ou seria maioria?) das
vezes nem se preocupou em assistir toda série preferindo permanecer na zona de
conforto da memória afetiva. Passando por uma baixa venda de itens
colecionáveis e brinquedos. Indo até mesmo aos pontos altos de uma série que
nos patrulhados anos 2000 ousou ir além, nas temáticas mostradas e em suas
abordagens, oque não é surpresa, desagradou muitas “pessoas preocupadas”.
Oque
segundo alguns dos realizadores da série, entre eles seu principal idealizador
Shanin Eric Danton, nos privou de novos e impensados desdobramentos: como a
origem de Snarf e a razão pela qual sobrevivia a todo tipo de ação violenta; e
a razão pela qual Escamoso odiava tanto os felinos num arco que colocaria o velho
Lynx no papel de um general amoral que matou quase toda uma geração de lagartos
ainda nos ovos ao incendiar um pântano.
Contudo,
acredito, que o caminho mostrado por estes Novos Thundercats, este ponto fora
da curva, assim como outras obras canceladas no passado como Jonny Quest (só
pra citar um exemplo), ainda servirá de referência para vários artistas, que
iluminados pelo “Olho de Thundera”, terão a verdadeira “visão além do alcance”
e nos trarão mais obras incríveis como esta.
Thundertcats! HOOOOOOOO!!!!!
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