Após
uma briga judicial de anos com o escritor e ilustrador Leiji Matsumoto, o
produtor Yoshinobu Nishizaki havia conseguido os direitos plenos sobre a saga
do Encouraçado Espacial Yamato e seus tripulantes.
Mas
quando em 7 de novembro de 2010, Nishizaki, faleceu após um absurdo acidente
num barco, um grande ponto de interrogação pairou sobre o futuro da mais importante
franquia da animação nipônica de todos os tempos.
E isto
num momento em que um ano antes a saga original tinha sido retomada com o OVA
“Yamato Rebirth”, e pouco mais de um mês antes da versão live action ir para os cinemas.
Mas
“assumindo” os negócios do pai, o filho de Yoshinobu, Shoji, decidiu partir do
zero, e em 2012 chegava aos cinemas japoneses a nova versão, o remake, da primeira saga do Yamato, “Busca
Por Iscandar”.
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A "nova" tripulação do Yamato |
Uma
atitude reprovável por um lado, já que Shoji deixou “Yamato Rebirth” sem um
final, e extremamente louvável por outro, já que a saga original de 1974 aos
olhos de uma geração mais nova com certeza poderia parecer desinteressante, em
especial em razão de seus gráficos.
E
em 7 de abril de 2012 chegava aos cinemas nipônicos, num formato até então
impensado, o primeiro dos sete longas metragens que tinham por missão recontar
a saga de “Busca Por Iscandar”. Formato inusitado, pois a série a princípio
tinha sido pensada para ser veiculada na televisão como a saga original, tanto
que assim foi, ao migrar para o mercado de home vídeo e sendo depois exibida,
já em 2013 desta forma na tevê.
Inclusive
tendo seu primeiro episódio exibido na tevê, uma semana antes de ir para os
cinemas, mas acredito que isto tenha sido apenas um chamariz (como se Yamato
precisasse disto).
Tendo
seus três primeiros longas produzidos pelo mítico estúdio AIC (o mesmo do
clássico Bubblegum Crisis), teve a produção dos quatro subsequentes realizada
pelo estúdio Xebec.
Falar
deste remake não é exatamente a tarefa mais fácil do mundo.
Primeiro,
pois sou um grande admirador da série clássica, mesmo com seus pequenos “furos”
aqui ou acolá, mas que no frigir dos ovos nunca impactaram em nada no seu
desenrolar e conclusão, e muito menos na admiração que causa até hoje.
Mas
resenhar este remake é especialmente
complicado não apenas por esta questão. Pois muito diferente, por exemplo, do remake de Thundercats que já resenhei
aqui, e que no fim das contas possibilitou aos seus realizadores criar
praticamente em cima de uma “folha em branco”, refazer Patrulha Estelar era se
arriscar sobre um roteiro praticamente perfeito, baseado acima de tudo nas
relações interpessoais de seus personagens. Uma obra de várias camadas, que
sempre gerou percepções diversas em que a assistia e ainda assiste nos dias de
hoje.
Lógico
que sendo uma adaptação, é mais que obvio que muitas coisas foram mudadas.
E
dentre tais mudanças não há como negar que as mais acertadas estão relacionadas
em como todo interior do Yamato foi repensado. Não vou aqui ficar me apegando a
tecnicalidades de menor ordem como o tamanho total da nave. Mas é impossível
não citar como todo seu interior foi extremamente bem pensado (e repensado), em
especial o hangar dos astro-caças, dentro de uma visão, digamos, mais técnica. E
até a ponte de comando se tornou um pouco menor, nitidamente “pegando carona”
na versão do live action de 2010.
Outra
coisa que salta aos olhos, mas que não deixa de ser também um pouco obvia são
as espetaculares cenas de batalha desta nova versão, ainda que na modesta
opinião deste escriba, tais cenas bebam na fonte de “Yamato Rebirth”,
tecnicamente falando. E que muito de sua eficiência e plasticidade deva ser
creditado aos profissionais do estúdio AIC que iniciaram a produção, pois vendo
o remake de “Cometa império” (que deixarei para resenhar em outra
oportunidade), fica claro, que ainda que refazendo cenas já conhecidas da saga
clássica, o pessoal do Xebec simplesmente foi “no embalo”.
E
antes que você que está lendo se pergunte.
Sim.
Ao menos na opinião deste que escreve este artigo, os pontos realmente
positivos desta nova versão da Patrulha Estelar param por aí.
Pois
a partir daqui entramos naquilo que Patrulha Estelar teve de melhor e que
sempre foi seu grande diferencial, ou seja, seus personagens e a estória que
conta, e para os quais as decisões de roteiro de “2199” nem sempre foram as
mais felizes.
Para
começar é preciso abordar as mudanças que foram feitas em alguns personagens da
saga clássica. E entre estas mudanças é preciso começar destacando o grande
número de personagens femininas inseridas na trama.
Algum
problema nisto? Você deve estar se perguntando.
Não!
Claro que não! Afinal ter Lola como a única personagem feminina relevante na
tripulação, sempre foi um dos pontos fracos no antigo Yamato. Contudo, algumas
das personagens como Yuria Misaki e Kaoru Niimi acabam se tornando um
penduricalho narrativo que nada acrescentam na trama.
Contudo,
fica o ponto de interrogação do “por que” fazem este tipo de coisa. Tudo bem.
Nós sabemos que é para atrair mais o público feminino e que as épocas são
outras.
Mas
se é assim, por que “2199” transforma Lola/ Yuki, a grande protagonista
feminina da saga, num pastiche de mocinha coadjuvante mais frágil na maior
parte do tempo que na “Busca Por Iscandar” original de 1974, tutelada pelo
capitão Gideon/Hijkata, e com direito a ângulos quase ginecológicos de seu
corpo?
Lógico
que alguém pode bradar neste momento que na série original a personagem era
sistematicamente assediada pelo robô IQ9, com direito a cenas de “levantamento
de saia”. Mas neste caso tais cenas figuravam dentro do escopo do chamado
“alívio cômico”, que ainda que possa ser considerado por alguns, politicamente
incorreto para os dias de hoje, não passava disto.
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Hardy/ Yamamoto acabou tendo o sexo mudado nesta nova versão |
Sem
falar na “mudança de sexo” de Akira Yamamoto. O piloto de astro-caças que aqui
no Brasil aprendemos a conhecer pelo nome ocidentalizado de Hardy, acabou na
nova versão se tornando mulher. Num artífice que foi imensamente criticado
quando do filme live action em 2010,
mas que aqui ao que parece a maioria dos fãs resolveu não levar em
consideração.
Não
que eu não goste da personagem, muito pelo contrário, e posso aqui afirmar que
sua promoção ao “primeiro time” de protagonistas, assim como sua história
pessoal, é uma das melhores coisas desta releitura.
Só
que aí vamos para mais um equívoco deste remake,
que foi o excesso de sub-tramas, que tentaram replicar o argumento humanizado
original de Leiji Matsumoto, mas que só serviram para tornar o roteiro desta
nova versão inchado e ao mesmo tempo com lacunas.
Não
que todas tenham sido assim tão ruins, como no citado caso de Yamamoto, mas
algumas destas sub-tramas mesmo que no começo aparentassem ser bem feitas, ao
fim da saga se demonstraram excessivas.
Como
no caso de Sandor/Sanada que ganha aqui uma importância muito maior que tinha na
“Busca Por Iscandar” original, sendo alçado inclusive à segundo em comando, além
de mostrar vários flashbacks da sua
amizade com Alex/ Mamoru, o irmão de Derek/Sussumu, quando mais jovens, e até
arrumando uma crush para o oficial. Só
que preciso dizer que isto foi milimetricamente pensado, já que o personagem é
extremamente querido nos Estados Unidos, um mercado que lógico não se poderia
virar as costas, onde sempre fizeram comparações suas (nem sempre justas) com
Spock de Jornada nas Estrelas.
E aqui
caímos numa trama que pouco ou nada colabora para a fluidez da obra, apenas
para satisfazer uma suposta parcela de público, talvez sendo este o grande
ponto negativo desta nova saga. Esta necessidade desenfreada de falar para
todos ao mesmo tempo, resultando em quase não conseguir se comunicar com
ninguém no fim das contas.
Mas
o excesso de elementos e as mudanças erroneamente planejadas não se
restringiram apenas a isto.
Pois
ainda há toda questão envolvendo Deslock e seu império.
Em “Busca
Por Iscandar”, Gamilon era apenas uma única nação, mas aqui resolveram criar
toda uma sub-trama política (mais uma sub-trama). Algo que os mais afoitos
saíram escrevendo artigos enaltecendo, alegando que isto aprofundava algo que a
saga original não tocou. Só que esqueceram que para isto, criaram um plot no qual as nações vencidas pelos gamilons
em suas guerras se tornavam cidadãos de segunda classe do império de Deslock.
Ou seja, copiando numa cara-de-pau sem limites aquilo que a Federação Polar do
Primeiro Ministro Ben Lazi fazia na terceira série de tevê, “A Crise do Sol”.
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Foram buscar "O Lobo" em A Crise do Sol para compor hype |
Sem
falar que de “A Crise do Sol” ainda foram buscar o tenente-coronel Wolf “O
Lobo” Flakken. Sim, ele mesmo, o comandante da esquadra de submarinos
dimensionais, que foi enfiado na trama, ao que tudo indica, apenas para
garantir um pretenso hype.
Mas
ainda é preciso falar do líder dos Gamilons.
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Em 2199 Deslock não parece de fato demonstrar nutrir um sentimento real por Starsha |
Na
saga original, Deslock sempre foi mostrado como um personagem com bastante
dualidade, ou como disse lá no primeiro artigo que escrevi aqui no blog, o mais
humano de todos os alienígenas, e talvez o mais humano personagem de toda a
saga justamente por isto, oque sempre o diferenciou de todos os outros
personagens do tipo. Só que este Desclock aqui desaparece, sendo substituído
por um mero déspota padrão, ainda que tentem manter sua parte da trama com
Starsha, mas que aqui se perde numa discussão sobre castas, absolutamente
desnecessária, e que não convence ninguém que Deslock pudesse nutrir algum
sentimento mais nobre por ela.
Fora
que o líder dos gamilons passa mais de
90% do tempo com uma irritante expressão de tédio em suas feições que nem de
longe lembram o shogun que nos
acostumamos ver.
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O comandante Todo está longe da figura altiva da saga clássca |
O
que me recorda que não posso deixar de citar a péssima escolha para o caracter design da maioria dos
personagens. E não me refiro apenas a jovem tripulação do Yamato, pois o
comandante Todo é mostrado nesta releitura numa forma aflitivamente frágil, que
nem de longe lembra aquela figura altiva, que inspirava confiança e respeito.
Agora,
creio eu, que caso você que esteja lendo, e não tenha visto ainda “Yamato 2199”
deva estar se perguntando, após esta avalanche de criticas, bem além do usual
que costumo fazer, se vale a pena assistir esta nova versão da saga da Patrulha
Estelar.
E
eu vou dizer aqui que sim. Pois apesar de todos os equívocos citados, uns
propositais, outros não, “Yamato 2199” consegue ter alguns momentos que
replicam quase a perfeição alguns dos acontecimentos da saga clássica, sendo
melhor que a imensa maioria das produções nipônicas atuais que se baseiam em personagens
rasos, esporrentos e gritões enfiados em tramas que não existem para plateias
ávidas apenas por alimentar discussões em redes sociais.
Mas
que em momento algum vai poder ser comparado com a clássica Patrulha Estelar naquilo
que a tornou um diferencial dentro do seu gênero de obra, pois é ausente em
seus realizadores do mesmo grau de paixão e comprometimento que os criadores da
saga clássica tinham.
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