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domingo, 15 de setembro de 2024

Drácula (1979) - Os Embalos de Sábado à Noite Nunca Foram Tão Assustadores

 

Alguns personagens nunca se afastam das telas de cinema durante muito tempo.

Tarzan, Sherlock Holmes e até Godzilla volte e meia (ou quase sempre) estão aí aparecendo na sala de cinema mais próxima, retratados nem sempre da maneira mais fiel para o qual foram pensados, e em geral falhando por causa disto.

Mas há exceções! E é sobre uma destas exceções que este artigo trata... Drácula do diretor John Badham!

Nos anos 1970 a chamada “sétima arte” havia passado pelo maior “sacode” que teve em sua história até os dias atuais. E em 1979 parecia que o cinema tinha sido virado de cabeça para baixo e depois pelo avesso.

Num exercício rápido de memória não é difícil lembrarmos de Tubarão (1975), Guerra nas Estrelas (1977), Superman (1978) só para citarmos os chamados blockbusters, além de outras produções que marcaram época e remodelaram os conceitos de seus subgêneros como O Exorcista (1973) e Agarre-Me Se Puderes (1977).

Mas em 1979 a Universal Studios decidiu apostar no clássico personagem de Bram Stoker, baseado no real Vlad O Empalador, nosso vampiro-mor, o Conde Drácula.

O diretor John Badham

Para tal empreitada convocaram John Badham, diretor que naquele momento estava mega-hypado devido ao sucesso de “Os Embalos de Sábado à Noite”. Uma escolha que aos olhos de qualquer fã do gênero deve ter parecido louca na época, mas que rendeu um filme com características singulares até então.

Para deixar bem claro (apesar que creio que você que está lendo já deve ter percebido), esta adaptação passa longe da estória original do romance de Bram Stoker.

Mas o que ela não tem de fidelidade ao original, compensa e com sobras para aqueles que gostam de um bom filme.

No quesito elenco, temos no papel-título nada menos que Frank Langella, que se você acompanha o blog sabe o quanto este humilde escriba é admirador, por sua capacidade de transmutar os personagens que interpreta, dando-lhes formas até então únicas, como nos casos do Zorro (já resenhado aqui) e do Esqueleto (sim, o do filme Mestres do Universo).

Frank Langella é Drácula

E para o papel de seu arqui-inimigo, Abraham Van-Helsing, nada menos do que aquele que por muitos é considerado o maior ator da história, Laurence Olivier, que é sempre lembrado por seu Zeus em “Fúria de Titãs”.

Laurence Olivier é Van Helsing

Papel que acabou sendo herdado, já que carismático Donald Pleasence recusou-o, pois não queria que sua atuação pudesse ser associada à do Dr.Loomis de “Haloween” realizado no ano anterior, ficando então com o papel do Dr.John Seward, diretor de um manicômio (pessoalmente acho que acabou trocando seis por meia-dúzia, mas deixa para lá).

Donald Pleasence é o Dr.Seward

E como se isto fosse pouco, John Williams, o mago da música, ficou responsável pela criação da trilha sonora, e de seu tema principal, que pode se considerar que está para Drácula como o tema que criou um ano antes está para Superman.

O mago John Williams criou a trilha sonora

Na estória, que foi roteirizada por  W.D.Richter (Invasores de Corpos), a escuna Demeter naufraga na costa da Inglaterra após seus tripulantes tentarem se livrar carga que levavam, pois julgavam estarem amaldiçoados.

Em terra, de seu quarto, Mina Van Helsing (Jan Francis), que aqui é filha de Abraham Van Helsing, e que estava em visita a sua amiga Lucy Seward (Kate Nelligan), vê a cena, e sai em busca de algum sobrevivente, encontrando apenas um homem caído entre as pedras.

Ainda que estranhando que os tripulantes do navio estivessem mortos, alguns deles com a garganta dilacerada, o homem é levado para a Abadia Carfax, que havia sido comprada pelo mesmo.

O filme em momento algum cria uma aura de mistério neste ponto, deixando bem claro que aquele homem era sim o Conde Drácula da Romênia e todos sabiam disto, e que os locais só não sabiam de sua “identidade secreta”, digamos assim.

E aqui começamos a entrar nas peculiaridades que tornaram algo singular na época, pois é nítido que este Drácula de 1979, é sobretudo focado na figura do conde, e não do vampiro, assim como o Zorro de 1974, também interpretado por Langella, já resenhado aqui, que é nitidamente mais focado em Dom Diego que no personagem título.

Tal abordagem talvez tenha acontecido devido a exigência do próprio ator, que disse que só faria o papel se não aparecesse com dentes caninos pontudos e nem com sangue escorrendo da boca.

Se tal exigência foi apenas um capricho, ou uma visão de Langella de que deveriam se afastar do estereótipo criado sobretudo pela versão de Christopher Lee nos filmes da produtora Hammer, talvez nunca saibamos, mas uma coisa eu afirmo, funcionou de maneira brilhante, pois deixou o filme livre para realizar suas cenas mais assustadoras através de seu elenco de apoio.

As cenas do manicômio inclusive são particularmente incomodas em alguns momentos, talvez ou principalmente, por retratar como eram tais instituições na época em que se passa o filme -1913 - sem ter o viés fantástico como “escada”.

E até meio escatológicas. Que o diga Renfield (Tony Haygarth) que ao acordar, depois que foi atacado pelo vampiro na forma de morcego, passa a ser seduzido por uma vontade peculiar de se alimentar de baratas.

Chamando a atenção para outra característica do filme que é a forma como as vítimas de Drácula acabam tendo efeitos colaterais diferentes, após serem atacadas.

Como no caso de Mina, que é dada como morta e acaba num estado de zumbi, na talvez mais impactante cena da película, quando Van Helsing e Seward vão até o túmulo da moça, e o professor Helsing desce até a catacumba onde deveria em tese estar o corpo de Mina, mas tem um “encontro imediato do pior grau” com a filha.

Uma cena que dizem ter sido terrível para Laurence Olivier que tinha acabado de perder a filha na vida real pouco tempo antes, o que aliás fica um tanto exposto nas feições do ator, que não estava muito bem de saúde à época das filmagens.

Mas calma que as particularidades deste Drácula não terminaram, pois como citei alguns parágrafos acima, este filme é sobretudo a respeito do conde e não do vampiro. Nos mostrando pela primeira vez um Drácula sedutor, extremamente autocentrado, com um semblante absolutamente normal, bem afastado por exemplo, da alegoria que Francis Ford Copolla fez Gary Oldman interpretar anos depois.

E que fora seus poderes, como se transformar em lobo, morcego ou em nevoa, pasmem, possui controle da mente. E não, não me refiro simplesmente à uma mera hipnose como descrito em algumas obras, mas sim controle da mente, algo que fica claro ter sido inspirado em “Guerra nas Estrelas”.

E não, este escriba não enlouqueceu, pois em determinado momento o conde da Transilvânia, para liberar Lucy de seu controle, faz exatamente o mesmo gesto com dois dedos que Obi Wan Kennobi (Alec Guiness) fez dois anos antes no filme de George Lucas.

Apesar da vontade inicial do diretor John Badham de fazer de seu “Drácula” uma homenagem explicita aos antigos filmes de terror, filmando em preto e branco, a Universal barrou a ideia.

Mesmo assim, ainda que “competindo” com ao menos mais dois filmes de vampiro lançados no mesmo ano (a saturação é um caminho bem curto para o fracasso nestes casos), a comédia “Amor à Primeira Mordida” e “Nosferatu”, alcançou o destaque merecido.

Portanto, mesmo que você (assim como eu), não seja muito fã do gênero, Drácula de John Badham é um filme obrigatório, de um diretor que com o passar dos anos mostraria toda sua versatilidade, como no já resenhado aqui “Trovão Azul", "Jogos de Guerra", "Tocaia" e tantas outras produções.

Fazendo aqui um filme de terror inteligente numa época em que as produções do gênero não tinham ainda ficado banalizadas pelos chamados filmes de slashers,  merecendo muito ser redescoberto pelas novas gerações.

E que não duvido, se surpreenderão, com a visão de Langella descendo por uma parede como um morcego na parede de uma caverna. Ganhando suas mentes ao ponto de torcerem pelo vampiro na sequência final deste clássico.



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