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quinta-feira, 9 de setembro de 2021

Ih! Deu Ruim! Alguns dos Mais Loucos Processos Judiciais da Cultura Pop!

 

Direitos de autor, prejuízos financeiros ou simplesmente absurdas crises de ego. Muitas são as razões que alimentaram processos judiciais no que se refere a chamada “cultura pop”.

Alguns que se resolveram facilmente (até mesmo pelo absurdo que representavam) e outros que se arrastaram por mais de uma década. Casos que por si só, já dariam um ótimo roteiro de filme.

E ainda que o “Enquanto Isso na Ponte de Comando” não seja um blog de “fofocas”, tal assunto é tão parte das raízes da cultura pop como tantos outros que geram debates e teorias.


Mas comercialmente falando, pode se dizer que o primeiro grande caso do gênero não envolveu exatamente os direitos autorais sobre uma obra ou personagem, e sim uma queda de vendas.

Estamos no ano de 1962, e pela primeira vez James Bond saía das páginas dos livros de seu criador, Ian Fleming, ganhando as telas de cinemas em “O Satânico Dr.No”. Contudo, em uma determinada cena, Q (Peter Buton), o criador dos gadgets de Bond (Sean Connery) e especialista em armas do MI-6, manda que este jogue fora sua pistola Beretta em calibre 22LR e troque por uma Walther PPK em calibre 7.65, exaltando os predicados da segunda arma em relação a primeira.

Bond e a Walther PPK

O resultado da fala, foi que a Beretta viu as vendas de suas pistolas despencarem mundo a fora, enquanto ao mesmo tempo ocorreu uma explosão de vendas das armas da Walther, mesmo que o preço das armas alemães fosse mais salgado. E a fabricante italiana não teve dúvidas, e disparou (desculpe o trocadilho) um processo contra os produtores do filme e o estúdio.

Walther e Beretta, as armas da discórdia

Que fim este processo teve, não sei. Mas abriu de vez os olhos de Hollywood com relação a força que suas produções tinham no que diz respeito a impulsionar produtos das mais variadas vertentes.

E por falar em produtos, nem sempre os que eram oferecidos aos profissionais de cinema eram exatamente da melhor qualidade ou devidamente testados. Vide o caso do ator Roddy MacDowall, que participou de quatro dos cinco filmes da saga original “Planeta dos Macacos” como os chimpanzés Cornelius e Ceasar, além de catorze episódios da série de tevê como Galen.

Roddy MacDowal, o eterno Dr.Cornelius

Pois bem, na época para que fosse possível que os atores pudessem fazer o movimento de fala de forma mais natural, a máscara de macaco que usavam era aderida a pele por meio de uma cola. Entretanto, devido a prolongada exposição ao produto MacDowall acabou desenvolvendo graves problemas de pele que logicamente levaram-no a processar os realizadores da saga que sempre garantiram a segurança daquilo que o ator usava. Tal episódio acabou se tornando importante para a evolução da maquiagem artística assim como para garantir alguns direitos trabalhistas dos profissionais do meio.

Agora se formos realmente pensar em direitos autorais ou sobre marcas, poucas vezes tive a infelicidade de saber de um caso como o que envolveu a DC Comics, que apresentou uma queixa na Secretaria de Propriedade Intelectual da União Europeia contra o Valencia, clube de futebol espanhol, por estar usando um morcego como símbolo, que segundo o que a editora pleiteava, seria um símbolo alusivo ao Batman.

Torcedores do Valencia com o símbolo do clube

Numa consideração bastante pessoal, creio que nenhum dos executivos da editora leu “Estranhas Aparições”, a fase de Steve Englehart em Batman, e sua estória dos “Peixes Risonhos”.

No mais, o clube de futebol soltou uma nota, na qual deixava claro que não iria ceder um palmo com relação a questão.

Mas as vezes acontece de Davi vencer Golias sim. Ainda que a luta demore décadas.

Acredito que você que está lendo este texto conheça a história de como Jerry Siegel e Joe Schuster venderam os direitos sobre o Superman por uma ninharia (130 dólares) ainda nos anos 1930. E vendo no que o personagem tinha se tornado, ainda em 1947 entraram na justiça para reaver os direitos de sua criação. Porém, nada feito, pois a justiça da época teve o entendimento que o personagem tinha sido criado por encomenda (decisão esta que aliás vai se repetir em outro caso muito famoso do outro lado mundo décadas depois).

Só que em 1976 criou-se uma emenda na legislação norte-americana que previa que o criador poderia reaver os direitos sobre sua criação ao fim de um determinado período obrigatório de renovação da cessão de direitos. E com base nela, em 1999, a família de Siegel deu entrada no processo para conseguir de novo os direitos sobre o “azulão”.

E assim, em duas sentenças em momentos distintos, uma em 2008 e outra em 2020 a família Siegel conseguiu os direitos sobre todos os conceitos básicos sobre o Superman de acordo com o que Siegel imaginou.

Jerry Siegel

Coisas como, sua origem, seus pais de Krypton, sua figura criança já na Terra, o Planeta Diário, Lois Lane e até sobre o uniforme. Enquanto que a DC manteve os direitos sobre criações posteriores como Lex Luthor, a kriptonita e Jimi Olsen.

Ou seja, Superman hoje é uma criança com a “guarda compartilhada”.

Guarda compartilhada esta que George Lucas teve que engolir. Sim ele mesmo, o criador do universo Star Wars, que diga se de passagem, não tem lá uma das melhores famas, quando se trata de defender os direitos sobre sua criação, tendo processado até fãs.

George Lucas processou o designer Andrew Ainsworth...

Isto lógico, antes da venda da marca para a Disney.

Pois não é que em 2004, Lucas processou Andrew Ainsworth, o design britânico que criou os uniformes dos StormTroopers, pois este (que à época passava por dificuldades financeiras) passou a vender algumas réplicas dos capacetes dos soldados do Império Galactico na internet.

...que ao fim do processo, ganhou a causa.

Contudo, contrariando as expectativas do cineasta, a justiça britânica deu ganhou de causa à Answorth em 2009. Não se dando por vencido, George Lucas apelou até à Suprema Corte que manteve a decisão anterior, apenas concordando que Answorth errou ao vender os capacetes nos Estados Unidos.

Permitindo assim que Andrew Ainsworth continuasse fazendo e vendendo seus capacetes, desde que nada no design original fosse alterado.

E esta coisa de ideia original, e quem fica com ela foi o estopim para talvez a mais mitológica guerra judicial da história da cultura pop.

E é obvio que falo do embate entre Leiji Matsumoto e Yoshinobu Nishizaki pelos direitos de Patrulha Estelar (Uchuu Senkan Yamato).

Em 1994, o produtor Yoshinobu Nishizaki, após mais de uma década, resolveu “reviver” seu maior sucesso, a saga do Encouraçado Espacial Yamato.

Porém, sabiamente (se é que dá para se referir deste modo), Nishizaki veio como uma estória que se passava 300 anos depois da saga clássica, sem nenhuma conexão direta com esta, talvez já tentando evitar problemas.

Mas não teve jeito, pois assim que Yamato 2520 saiu, ainda para o mercado de home vídeo, e se tornou de conhecimento de Matsumoto, o velho mangaká não teve dúvidas, e disparou sua “arma de ondas” na direção do produtor. Mas por que isto?

Para explicar, é preciso fazermos uma rápida viagem no tempo de volta ao começo da década de 1970.

Pois lá no comecinho dos anos de 70, Nishizaki começou a trabalhar na estória que se tornaria a Patrulha Estelar. Contudo, na época, trabalhando com outro mangaká que apenas seguia o que o produtor lhe orientava.

Mas qual eram as ideias de Yoshinobu?

Bem, basicamente o produtor criou todo o conceito do roteiro que já naquela época continha os gamilons que atacavam a Terra, e a saga de um grupo de terráqueos que iriam numa viagem até o distante Planeta Iscandar, buscar o Cosmo DNA, o elemento que limparia a nossa atmosfera da radiação das bombas dos gamilons.

Só que tal viagem seria feita em nada menos que um asteroide. Sim! Um asteroide no qual seria instalado um motor.

Contudo, quando Leiji Matsumoto assume a parte técnica da produção por assim dizer, e vê que a ideia de Nishizaki era boa, mas poderia ser melhorada, começa a sugerir mudanças no projeto.

E é de Leji Matsumoto, toda a ideia de se usar o velho encouraçado Yamato da 2ª Guerra Mundial como base para a nave, que obviamente originou o título da saga. Assim como são de sua autoria a criação de vários personagens, entre estes a gatinha Mi-Kun (ou Mimi, como conhecemos aqui em Terra Brasilis) que foi uma homenagem a primeira de uma série de gatas com mesmo nome que o roteirista teve.

Matsumoto chegou a fazer um cameo de Nishizaki

E tudo isto foi feito com 100% de carta branca de Nishizaki. Que teve até um cameo feito por Matsumoto na primeira série de tevê, "Busca Por Inscandar".

Durante a produção da saga clássica, produtor e mangaká acabaram por se desentender, mas até então, cada um foi para seu lado, e tudo bem.

Só que com o lançamento de 2520, a coisa babou e a guerra começou. Uma guerra judicial com desdobramentos inusitados até fora dos tribunais. Como quando Nishizaki foi preso com uma pequena quantidade drogas, e uma quantidade de armas e munições que fariam John Matrix (o personagem de Schwarzenegger em Comando Para Matar) ficar com inveja.

Ao ser preso, Nishizaki tinha até um fuzil M16 com lança-granadas como o da foto

Só para se ter ideia, em meio ao arsenal que segundo consta, o produtor tinha comprado numa viagem as Filipinas, havia até um fuzil M16 equipado com um lançador de granadas M203.

E foi nesta época que saiu a primeira sentença a favor de Matsumoto, que não perdeu tempo, e colocou na praça uma versão totalmente sua para a saga, era Dai Yamato Zero Go.

Porém, Nishizaki apelou, e em 2008 saiu a decisão definitiva em última instância que dava ao produtor todos os direitos sobre a saga.

Uma decisão que quando escrevi a resenha sobre o remake de “O Cometa Império” não imaginava ser tão restritiva e nem que teria sido conseguida com os argumentos que foi.

Pois o argumento usado por Yoshinobu Nishizaki em pleno século XXI foi o mesmo que a DC Comics usou para manter os direitos sobre Superman em 1947. De que Leiji Matsumoto tinha feito tudo sob encomenda, e que tinha sido pago para isto.

E a única obrigação que o produtor teria, era apenas de citar nos créditos de qualquer produção do Encouraçado Espacial Yamato, o nome de Matsumoto, mas sem a obrigação de pagá-lo nem um iene sequer.

E bem que chegando ao final deste artigo atípico, gostaria de ter algumas palavras edificantes, ou talvez até engraçadas, sobre as confusões citadas e tantas outras que conhecemos, mas no fim das contas tudo que consigo pensar é que todas as partes envolvidas nestes tipos de relações, mas em especial os artistas, precisam sempre estar atentos sobre seus direitos, e procurar manter uma relação mais clara possível com a outra parte envolvida

 

 

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