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quarta-feira, 3 de janeiro de 2018

Batman - A Trilogia (parte 1)



Meu contato primário com HQ’s vem da época da revista “Superamigos”, e nesta época o Batman que vinha sendo publicado era a fase escrita por Steve Englehart e desenhada Marshall Rogers, e assim como eu, uma geração inteira foi marcada por esta fase que foi uma das mais realistas do personagem, com estórias muitas vezes de conceito bem intimista que primavam, sobretudo por abordar as relações interpessoais dos personagens num nível até maior que o feito com o personagem antes por Dennis ONeil e Neal Adams (só pra lembrar, foi nesta fase, por exemplo, a primeira vez que Dick Grayson contestou abertamente Bruce Wayne).

 Quando do lançamento em 1989 do Batman de Tim Burton nos cinemas a decepção foi gigante, pois tudo ali era tão fake, tão artificial, tão cartunesco (no mal sentido mesmo), que não conseguia de forma alguma enxergar o personagem denso que lia nos quadrinhos naquilo. E nem vou citar os dois filmes de Joel Schumacher pra não gastar o meu e o seu tempo. Oque lançou o personagem num verdadeiro limbo no cinema, mesmo que seu sucesso nas HQ’s e animações fosse notório.



E por que estou explicando tudo isto? Bem...
Há algum tempo atrás fiz um artigo aqui no “Ponte de Comando” sobre o icônico Superman de 1978 de Richard Donner, e naquela oportunidade me referi ao fato de como era complicado escrever sobre algo que tantos já haviam falado tanto.
E eis que mais uma vez aqui estou diante do mesmo desafio, só que desta vez em dose tripla. Resenhar a trilogia Cavaleiro das Trevas de Cristopher Nolan. Uma tarefa complicada, mas ao mesmo tempo extremamente prazerosa que inicio agora por “Begins” (sem intenção de trocadilho).



No começo de 2003 eis que a Warner decide retomar a franquia Batman, e para isto chamam o diretor Cristopher Nolan (Amnésia) para comandar o projeto. Contudo, oque talvez nenhum executivo do estúdio pudesse imaginar fosse que Nolan, fã do Superman de Donner, tomaria o projeto pra si, bancando abordar o personagem por seu viés mais realista, que sempre tinha ficado para trás nas versões anteriores do Morcego no cinema.

Nolan com Richard Donner, inspiração e admiração

Vamos aqui deixar claro que Nolan nunca mentiu ou tentou se auto promover dizendo um fã de HQ’s, e talvez, ou justamente por isto seu trabalho de pesquisa precisava (e foi) extremamente minucioso, e no caso de “Begins” extremamente calcado na fase citada de ONeil e Adams além óbvio de “Batman Ano Um” de Frank Miller e até mesmo o longa de animação “A Máscara do Fantasma”, só pra citar três fontes de inspiração mais relevantes.
Tudo para criar um amálgama que conseguisse condensar décadas e décadas de versões e visões do personagem e não apenas vislumbrando a mera adaptação fácil de um autor apenas.

Batman e o objetivo que nortearia a saga

Avesso ao subterfúgio fácil e tentador dos efeitos por computação gráfica, usados aqui na maioria da cenas apenas para retocar as mesmas, por assim dizer, construiu toda a escalada do personagem até seu surgimento sem a menor pressa, tal qual Richard Donner fez com Superman. E dando ao Batman um objetivo, uma missão, que ao longo dos três filmes da franquia perfazem um círculo perfeito.
Além de tomar decisões técnicas, como manter sua visão sobre um novo Batmóvel totalmente repaginado e agressivo,    que durante a cena da fuga de Arkham, quando Batman é perseguido pela polícia, alcançou a insana velocidade de 110km/h, coisa que simplesmente ninguém faz, não só pela dificuldade, como pela questão da segurança, usando comumente de vários artifícios para criar a ilusão de que os carros estão  em altas velocidades.

O Thumbler (o novo Batmóvel) em cena à 110km/h.

Ou quando optou por um Batman que de fato usasse de golpes de defesa pessoal, coisa que antes só me recordo ter visto em “Máquina Mortífera”, por coincidência (ou não) outra obra de Richard Donner.



Fora ter dado funcionalidade a itens da roupa do personagem como o aparelho de escuta nas orelhas e a capa que se tornava rígida se transformando numa espécie de asa-delta.



Mas e o elenco? Pois é, aí vamos para aquele conhecido capítulo à parte.
Mais uma vez seguindo a cartilha traçada lá em 1978, construiu um elenco recheado de atores de primeira linha, aqui não apenas para em tese atrair público, mas mais ainda, para construir com solidez as relações entre estes personagens.
Lógico que para começar, precisamos falar de Christian Bale, que escolhido entre outros atores como Jake Gylenhaal e Cillian Murphy (ele mesmo, o Espantalho), teve a tarefa de encarnar absolutamente todas as facetas de Bruce Wayne/Batman durante sua evolução até surgir como o “cruzado encapuzado” de Gotham.

Bale testando a roupa de Batman

Nos brindando ao longo da trilogia com diálogos absolutamente antológicos que poderiam ser inseridos em diversos contextos diferentes das relações humanas, conseguindo assim fazer com que mesmo o público não fã de quadrinhos se importasse com o personagem e seu destino.

“...alguns atores poderiam interpretar um excelente Bruce Wayne ou um excelente Batman, mas Bale podia interpretar as duas personalidades radicalmente diferentes” (David S. Goyer - roteirista)

Sem falar que Bale era fisionomicamente, a cara do Bruce Wayne clássico desenhado por Neal Adams.

Bale, fisionomicamente muito parecido ao Bruce de Neal Adams.

E aqui é preciso citar que talvez a maior sabedoria dos realizadores desta trilogia foi entender que o Batman só é o Batman devido a todos aqueles coadjuvantes de importância igual ao do personagem principal, e de se entender que quando se fala do Batman de Gotham City estamos falando de todo um universo à parte do restante do universo da DC Comics, que possui vida própria, e intimamente ligado com questões muito reais. Então, à medida que Alfred (Michael Caine), Lucius Fox (Morgan Freeman), e principalmente James Gordon (Gary Oldman) vão surgindo e se mostrando elementos essenciais na construção da trama isto fica nítido.

Lucius Fox, Alfred Pennyworth e Jim Gordon, cada um espécie de face do própio Batman.

Sendo que Oldman configura aqui um caso absolutamente a parte, pois a princípio ele estava escalado para viver um vilão, porém, quando Chris Cooper desistiu do papel, este lhe foi oferecido.
E oque isto tem de mais? Bem, desde “O Profissional” e seu incrível Norman Stansfield que Gary Oldman vinha estigmatizado, só fazendo papéis de vilões e malucos. E por melhor que os fizesse isto não deixava de ser uma injustiça com um ator tão incrível e versátil. E eis que Oldman pega esta oportunidade, e em meio a personagens que vivem no limite e que pela própria natureza representam extremos, nos brinda com um maravilhoso bombardeio de sutileza, feito não apenas de diálogos incríveis, mas de pequenos gestos e olhares, que simplesmente muitas vezes passam despercebidos pelo público médio, numa verdadeira aula de interpretação. Tornando seu Jim Gordon uma representação tão perfeita, que arriscar-me-ia dizer estar no mesmo nível de Cristopher Reeve e seu Superman.

Gary Oldman, e sua incrível sutileza na composição de Jim Gordon.

Que bom que não se tornou vilão (risos).

Ra's Al Guhl e Espantalho, escolha certa de antagonistas.

Até porque de vilões este filme está muito bem servido, pois mais uma vez fugindo da obviedade de se colocar aqueles personagens mais conhecidos, “Begins” não é apenas atento à construção histórica do personagem principal, mas também há como seus antagonistas funcionam em sua escalada, nos trazendo uma galeria de vilões que iam desde os destaques para Ra’s Al Ghul (Liam Nesson) e Espantalho (Cillian Murphy, simplesmente incrível, sendo o único antagonista presente nos três filmes).

Cillian Murphy e seu Dr.Crane/ Espantalho
Passando pelo chefe mafioso Carmine Falcone (Tom Wilkinson) talvez o grande responsável por abrir os olhos do jovem Bruce Wayne para o mundo.

Carmie Falcone (Tom Wilkinson)

Até o “service” de colocar o matador Victor Zsasz (Tim Booth) numa cena de uma audiência de custódia.

Victor Zasz (Tim Booth)

E para embalar tudo isto a maravilhosa trilha sonora de Hans Zimmer pontuando de maneira perfeita cada momento do filme, talvez apenas com um único “porém”, a ausência de um tema-principal que fizesse com Batman, o mesmo que aconteceu com Superman e a música de John Williams, ou mais recentemente com o tema da Mulher Maravilha.



Mas como estamos falando de uma saga, vou parando por aqui, para no próximo episódio falar sobre “O Cavaleiro das Trevas”, aquele que é considerado por muitos o melhor filme do gênero, suas histórias talvez mais inacreditáveis que a ficção, e como Heath Ledger e seu Coringa destronaram Darth Vader do posto de maior vilão da história do cinema. Até lá.



                                

           



                                 












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