Algum
tempo atrás no canal do “Enquanto Isso na Ponte de Comando” no Youtube, foi
feita uma lista sobre os “10 Melhores Filmes de Ação dos Anos 90”.
Contudo,
só após o vídeo ir ao ar, me dei conta de que um filme excepcional tinha ficado
de fora. Algo totalmente fora do que seu ator protagonista havia realizado até
ali...
Vencer
ou Morrer!
A
história de “Vencer ou Morrer” (Nowhere to Run no original) começa ainda no ano
de 1986, quando o roteirista Joe Eszterhas (Instinto Selvagem) e o diretor
Richard Marquand (O Retorno de Jedi), se uniram para escrever um roteiro que
essencialmente seria um drama, com apenas uma pontinha de tensão lá pelo fim de
seu terceiro ato, e que pelos planos de ambos deveria ser estrelado por Mel
Gibson.
Joe Eszterhas com Sharon Stone durante as filmagens de "Instinto Selvagem" |
Richard Marquand fazendo um cameo em "O Retorno de Jedi" |
No
entanto, com a inesperada morte de Marquand em setembro de 1987, o roteiro foi
engavetado, até que em 1991 o astro dos filmes de artes marciais e quase
“Predador”, Jean Claude Van Damme conhece os produtores que detinham os
direitos sobre a obra enquanto filmava “Duplo Impacto”.
Sendo que apenas em 1992 durante as filmagens de “Soldado Universal” o belga, que sonhava
em diversificar seu portfólio, travou contato com o roteiro original, se
interessando pelo projeto. Contudo, de cara exigindo que este fosse reescrito
para que fossem inseridas mais cenas de ação.
Desta
forma o estúdio contratou outros dois roteiristas, Leslie Bohem e Eandy Faldman,
que junto ao próprio Joe Eszterhas, deixaram as coisas um pouco mais do
jeitinho Van Damme.
Ainda
que no fim das contas tais mudanças tenham deixado Joe Eszterhas bastante
descontente com o resultado, dizendo que as ideias do ator destruíram o
conceito original de sua estória. Uma opinião que acabou ironicamente sendo
compartilhada pelo próprio Jean-Claude que em entrevistas posteriores ao
lançamento, seja lá por quais razões, declarou que também não tinha gostado do
resultado final do roteiro.
Seja
lá como for, a direção do filme foi parar nas mãos do competente Robert Harmon
de “A Morte Pede Carona”, que ainda que não tivesse lá muito experiência nem
com filmes de drama ou de ação “rasgada” entregou um trabalho extremamente
competente, não poupando elogios à dedicação de Van Damme ao projeto, e
afirmando que o belga tinha sido a escolha certa para o papel.
O diretor Robert Harmon com Rutger Hauer durante as filmagens de "A Morte Pede Carona" |
Acho bem difícil que você que esteja lendo não conheça a estória de “Vencer ou Morrer”, mas caso não, basicamente temos aqui uma premissa que parece saída de um filme de faroeste.
No
enredo, o fugitivo Sam Gillen (JCVD), condenado por um crime que havia assumido
para salvar o irmão da cadeia, escapa e acaba indo parar numa fazenda de uma
jovem viúva chamada Clydie (Rosana Arquette, o nariz arrebitado mais bonito do
cinema).
Se
tornando protetor dela e de seus dois filhos, a menina Bree (Tifanny Taubman) e
o garoto Mookie (Kieran Culkin, irmão de Macaulay Culkin), contra os ataques de
Franklin Hale (Joss Ackland, bem conhecido do público por ter sido o vilão de “Máquina
Mortífera 2”), um megaempresário inescrupuloso que estava comprando todas as terras
daquela localidade, nem que fosse na marra, usando para isto os serviços de bandido
contratado Dunston (Ted Levine, o Bufallo Bill de “O Silêncio dos Inocentes”).
Durante
os anos venho observando as mais diversas críticas bizarras sobre este filme, que
sim, é uma colcha de clichês, mas que os trabalha de maneira exemplar, ainda
que não, digamos, genial. E que é sim algo diferenciado e não repetido
posteriormente na carreira de Jean-Claude Van Damme.
JCVD durante as filmagens de "Vencer ou Morrer" |
É
quase como se incomodassem com o simples fato de que um ator de filmes de ação
B, quisesse algo mais para a própria carreira, e dissessem intrinsecamente:
Cara, nós até gostamos de você, mas fica aí no teu canto.
E o
pior é quando os “especialistas” tentam rebaixar o filme com argumentações do
gênero: A cenas de luta são fracas.
O que
lógico, acarreta nos já conhecidos “parênteses” que preciso volte e meia
inserir aqui nos textos do blog.
No
primeiro caso, pouco pode ser feito, pois a indústria do cinema é de todas do
setor cultural a mais especializada em rotular gêneros e profissionais que trabalham
nela, não importa o quanto sejam bons, ou até mesmo quanto lucro tragam para
ela. Isto sem mencionar o séquito de “seres cultos”, sempre dispostos a manter
rótulos e promover um status quo que
mesmo por mera questão de ego lhes privilegie.
Mas
no segundo caso, se enxerga com clareza a dicotomia ente “aquilo que ser quer”
versus “aquilo que de fato a obra pretendeu ser”.
É
perfeitamente compreensível que o público médio dos filmes de Jean-Claude Van
Damme, num primeiro momento possa ter estranhado, e até certo ponto dado uma
torcida de nariz para “Vencer ou Morrer”.
Afinal
aqui não há nenhuma das características que nortearam o começo da carreira do
belga, como espacates que desafiam as leis da física, dancinhas constrangedoras
que geram momentos cômicos involuntários, e muito menos caretas de quem está
fazendo um tratamento de canal.
Aqui
Van Damme não é um especialista em artes-marciais que bate em 99% do elenco sem
sofrer um só arranhão, aliás muito pelo contrário.
E
possui motivações muito mais nobres que pura e simplesmente se provar num
torneio qualquer ou executar um mero plano de vingança (ainda que ninguém
resista a um bom filme de vingança, óbvio).
Portanto,
creio que seja plenamente possível contextualizar que um filme como “Vencer ou
Morrer”, mesmo que em momento algum tentando “reinventar a roda”, se torna, não
apenas para seu protagonista e realizadores, um desafio de sair da zona de
conforto, assim como para parte do público cativo, que precisa se defrontar com
doses de drama e até romance com as quais não estavam previamente dispostos a
lidar.
Nos
servindo quase duas horas que sim, estão recheadas de ótimas cenas de ação,
como a fuga de moto de Gillen, inspirada no clássico “Fuga do Inferno” com
Steve McQueen, mas que vão além do mero entretenimento escapista.
Entregando uma aventura com alma e coração, e com um final que passa bem longe do fantasioso.